“A humanidade precisa fazer uma escolha. Iremos percorrer o caminho da desunião ou adotaremos o caminho da solidariedade global? Se escolhermos a desunião, isso não apenas prolongará a crise, mas provavelmente resultará em catástrofes ainda piores no futuro. Se escolhermos a solidariedade global, será uma vitória não apenas contra o coronavírus, mas contra todas as futuras epidemias e crises que possam assaltar a humanidade no século XXI.” 

Yuval Noah Harari no FT


Yuval Hahari, escritor dos livros "Sapiens", "Homo Deus" e "21 lições para o século 21", escreveu um brilhante artigo no Financial Times (1) apresentando as consequências e recomendações para lidarmos com a crise do COVID 19.

Em um mundo marcado pela construção de muros, busca por isolamento, e incapacidade de diálogo, Harari, aponta a corrosão das bases que sustentam a confiança como um dos principais problemas para lidarmos com este tema de forma mais madura e sistêmica.

Neste momento estamos assistindo ao colapso de sistemas de saúde, ao fechamento de fronteiras em todo o mundo, cadeias produtivas totalmente paralisadas, incapacidade de mitigação do crescente número de mortos. Além disso, indivíduos defrontam-se com a ansiedade e o desconhecimento sobre a melhor forma para lidar com a complexidade dos fatores envolvidos.

O coronavirus se apresenta, mais do que um desafio de saúde, como uma oportunidade para efetivamente resgatarmos nossa capacidade de agir de forma solidária e além fronteiras.

Esta situação coloca em xeque um conjunto de escolhas que nossas sociedades fizeram ao longo dos últimos anos, simbolizada pela construção de muros, que impedem a passagem do ser humano, mas não de um simples vírus. 

Percebemos da pior maneira possível, como nossa vida é plenamente interdependente, e que em um mundo globalizado, as competências para solucionar crises extrapolam ações individuais ou locais, exigindo um tratamento sistêmico para obtermos resultados satisfatórios.

A realidade mostra que o atual sistema é incapaz de construir soluções coletivas, seja na Europa, que independentemente da União Europeia estabelecer fronteiras abertas, cada pais decidiu se fechar, seja nos EUA que isolaram-se unilateralmente impedindo voos, ou no Brasil onde o poder central não alinha-se aos governadores de estados.

As ações são isoladas, e perde-se a capacidade de coordenar o uso de recursos de forma integrada, e de compartilhar aprendizados tão essenciais a emergência do atual contexto.

Compreender isto, implica na adoção de modelos de governança que rompam os tradicionais silos, e de sistemáticas de gestão de riscos capazes de acolher a imprevisibilidade e a emergência dos fatores que não podemos prever, permitindo a atuação rápida e ágil de todos os envolvidos neste desafio

O coronavirus não é um problema de médicos ou de governos, é acima de tudo uma questão que impacta a sobrevivência de toda a sociedade, e neste sentido, implica na responsabilidade individual e coletiva de cada um.

Quanto mais compartilharmos informações, conhecimentos e recursos, maior nossa chance de sermos bem sucedidos.

Um aspecto chave, é que ao longo dos últimos anos fomos capazes de desenvolver diversas tecnologias e modelos gerenciais que podem nos ajudar neste desafio: inteligência artificial, sistemas de comunicação móveis, impressoras 3D, redes descentralizadas de projetos e de inovação, modelos ágeis de trabalho, dentre outros

A questão é: como podemos integrar este conjunto de competências para desenvolver rapidamente soluções que minimizem o sofrimento humano e os impactos sociais e econômicos decorrentes desta situação. 

Uma das respostas a esta questão é dada por Amy Edmondson, professora de Harvard, que estuda a importância das equipes na solução de problemas complexos. Segundo ela, em ambientes onde os problemas são cada vez mais complexos, precisarmos desenvolver habilidades para atuar em equipes multidisciplinares, que exigem objetivos compartilhado e abertura para acolher erros para evolução rápida do time. Para isto é essencial criarmos um ambiente de segurança psicológica onde as pessoas possam levantar questões, preocupações e ideias sem medo de represálias.

O fato é, a crise do coronavirus coloca em xeque 2 visões de mundo, uma focada em um modelo centralizado de governança, comando e controle, que espera uma liderança para resolver o problema, e outra que compreende que o modelo de atuação deve ser mais aberto, onde redes de organizações e indivíduos atuam de forma descentralizada a partir de propósitos comuns. Naturalmente esse modelo exige uma coordenação central, que seja capaz de assegurar transparência e agilidade ao fluxo de informação, assim como a coordenação dos recursos necessários para que as equipes que operam de forma autônoma e localmente, possam gerar e receber informações, competências e recursos essenciais aos seus objetivos.

Esse modelo tem como premissa a transparência entre os participantes, isto é, a capacidade de colocar abertamente os problemas e discutir soluções que contribuam para a resolução do problema. Apenas desta forma, o conhecimento, as boas práticas. as soluções locais poderão ser compartilhadas em um processo de retroalimentação, que possibilita a construção de novos conhecimentos e soluções.

O que estamos vendo hoje, talvez seja o oposto deste raciocínio. Estamos vendo uma disputa global pelo pioneirismo do desenvolvimento da vacina salvadora, ao invés de uma atuação integrada para rapidamente identificarem uma solução que permita a todos se beneficiarem. 

A segurança psicológica é a base para construção de um ambiente de confiança em um mundo tão polarizado. 

Se você gostaria de compreender os diversos aspectos da segurança psicológica em equipes, veja o vídeo (link abaixo) de uma apresentação de Amy Edmondson no TED, destacando os principais fatores que contribuem para a construção de times capazes de resolver desafios complexos, como salvar os mineiros presos em uma mina no Chile.

https://www.ted.com/talks/amy_edmondson_how_to_turn_a_group_of_strangers_into_a_team?language=pt-br


Bom trabalho


Eduardo Hiroshi 

Linea Consulting 


(1) https://www.ft.com/content/19d90308-6858-11ea-a3c9-1fe6fedcca75